sábado, 3 de março de 2012

Nesse mundo, ele é muito pequeno, existe tudo. Cabe na palma da mão, em uma cama, numa floresta, e nele cabe tudo. É muito doloroso sair, nem sempre é tão fácil entrar; não é difícil entrar. Quando você sai, vem uma sensação estranha. Um pouco de dor de cabeça, uma tontura, uma confusão. Não se sabe bem onde se está. É preciso comer e dormir bastante fora dele para que se retorne ao que não é ele. Existe uma membrana, a membrana separa. É possível ficar preso na membrana, emaranhado, emembranado, aí fica tudo definitivamente muito confuso, a dor de cabeca, a fome, o sono e a sensação de inexistência como um todo se tornam ainda maiores. É lindo esse mundo. Como ele tem tudo, frequentemente é possível correr num campo bem grande, verde, de grama, cheio de pequenas montanhas, grandes, verdes, macias de deitar, com flores esporádicas de tão bonitas que são. É possível também, se essa for a vontade do habitante, apenas observar esse mundo de uma janela, colada a uma parede amarela-marrom, cor de madeira clara, como se se estivesse com a cabeça enfiada num quadro. Nesse mundo, não tem tempo, apesar de ter a surpresa com o dia que já nasce, com o canto das aves (tanto galos quanto passarinhos) e até comentários sobre as horas e os compromissos - vazios, pelo hábito de quem esquece que o tempo lá não existe. Nesse mundo, não existe fome, porque fome que não incomoda não é fome, mas existe todo o prazer em  preparar a comida e mais do que isso em comer. Existem beijos e abraços infinitos e eternos, que se tornam cada vez melhores, de um modo que os próprios habitantes costumam estranhar que aquilo tudo apenas melhore e que pareça agora que têm uma cola na boca e no corpo inteiro que é responsável por esse admirável fato. As músicas, mesmo as mais feias, são as mais bonitas, e as risadas estão sempre à beira de um colorido abismo, prontas a se lançarem umas contra as outras, entrelaçando-se num canto, num coro, numa canção. Os cheiros, sobretudo o do suor, alimentam os pulmões, são capazes de regenerá-los; os olhares flúem e, quando cruzados, um experimenta olhar com o olhar do outro, o outro faz o mesmo com o um que experimenta olhar com o olhar do outro: os olhares lá são crianças, voltam a ser o que são. Todos são jovens, principalmente os velhos. Todos são velhos, em especial os jovens. Todos são tudo, tanto quanto coisa nenhuma. A Lua sempre nunca esteve mais bela. Nesse mundo, onde não existe nada, além de nós dois.

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