quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Ele não tinha nome.
Ela não tinha nome.

O fundo do mar
é anônimo.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Não sei o que era.

O que entrou aqui parecia um morcego, parecia um beija-flor; parecia uma borboleta, parecia tudo isso junto, um ornitorrinco; mas, agora, tenho quase certeza, era uma mariposa. Cristã. Grande e cristã. Quando ela se aproximou da luz, consegui ver aquela mancha vermelha, o corpo dela era grosso, será que aquela porra era uma mariposa mesmo? Grande e cristã demais.

E vermelha, entrou pelo quarto voando bêbada, a ornitorrinca cambaleante; entrou pela porta, não foi pela janela, não, antes que você pense, antes que você ache, antes que você diga. A diferença entre o ponto e o ponto e vírgula é o tamanho da expectativa. Maripousou – é uma associação inevitável,  pensei até que se escrevesse “maripousa”, de tão inevitável, mas, mesmo não se escrevendo, o nome tem essa origem, junto com Maria, que bonito – Maria pousou bem em cima da porta do guarda-roupa. Tem uma listra marrom lá, talvez ela tenha sentido afinidade de galhos para com ela. E ficou lá. De boa. 

Comecei a me sentir incomodado, a maripousa no meu cômodo definitivamente me incomodava. Transformou meu cômodo num incômodo, por não conseguir entender que bicho era, por ela voar tão louca e inconsequentemente, por mim. Essa incerteza sobre onde ela iria parar depois dali, esse sentimento humano de segurança que a gente persegue e não percebe: não queria matar, queria não. É uma irmã também. Nem formiga, desde pequeno. O que é que eu faço, então, essa porra, vou cutucar.

Cutuquei com a vassoura a maripousa, vou chamá-la assim agora, ú, cutuquei com a vassoUra. Com os cabelinhos da vassoUra, quase fazendo cosquinhas nela, quase não. No começo. Mas aí foi que ela inventou de buscar a luz. A luz do quarto acesa, pra que eu visse ela, ela ainda não havia buscado. Mas, eu não sei, ela era uma maripousa com dificuldades mesmo, ela não conseguia ficar por ali, na luz, nem se fixar por perto. Ela rondava, rondava, rondava – de noite eu rondo a cidade, a te procurar, maripousas são animais noturnos: As mariposas ou traças, são insetos lepidópteros da divisão dos heteróceros, que reúne espécies de vôo noturno, com antenas filiformes ou pectinadas e, em algumas regiões, os espécimes de maior tamanho e de coloração escura são chamados de bruxas. O que mais difere as mariposas das tão conhecidas borboletas é que as borboletas possuem antenas finas e com uma pequena esfera na ponta, já as mariposas possuem antenas diferenciadas de acordo com sua espécie; as mariposas assim que pousam deixam suas asas abertas e as borboletas colocam suas asas de maneira vertical. As mariposas têm hábitos noturnos, diferente das borboletas. Fonte, wikipedia.

Acho que era uma borboleta, apesar dos hábitos noturnos. As asas e, se fosse mariposa, era bruxa. A borboleta rondava a luz, mas não conseguia se fixar. Libélula não era. E acabava desistindo, pousando em algum outro lugar, mesmo que sem luz. Como pousou sobre a imagem de Maria algumas vezes. Minha nossa, só pode ser uma Maria-pousa, então. Se não, porque essa procura? Eu pegava a vassoUra, cutucava novamente, e ela luz e Maria. Luz e Maria, luz-e-Maria, Luzemaria. Ave Maria. Ave, não, voava mas não era ave, já descartei o beija-flor; a possibilidade. de ser um beija-flor. Pensei nele por conta das asas, batiam de um jeito. Assim. E isso de procurar a luz e não conseguir também, e essa infinidade de mensagens metafóricas, as simbologias xamânicas e. A borboleta-maripousa não ia embora do meu incômodo, e a porra da minha cabeça se dividia mais uma vez entre o físico e o metafísico: representação e essência, terra e água, Lua e Mercúrio, Virgem e Peixes.

A minha brilhante, luminosa ideia foi a seguinte, um plano, para o plano físico: não vou matar. O que a atrai? A luz. Então, apago a luz, trago uma luminária; acendo a luminária próximo à janela, e espanto-ela pro jardim. Por sobre a minha cabeça, aparece a lâmpada acesa dos desenhos animados. Plim.

Deu certo. Ela foi embora





E me deixou com todas essas reflexões extraterrenas. A luz, o vôo, o não conseguir fixar-se à luz, a busca pelo sagrado, Maria, Maria pousa, a mariposa como símbolo da alma e da inteligência, e da psiqué, e da metamorfose, a transformação das duas, mariposa e borboleta, morte e regeneração, eu, a desorientação cambaleante, tropeçando no ar, a borboleta como dispersão, beleza, busca, dispersão, gêmeos, madrugada, bruxa, eu, meus hábitos noturnos, o meu cômodo incômodo, a minha, de certa forma, caça, a minha, com certeza, insegurança, e o que eu vivo, o que eu vivo agora, e isso, essa mariposa-borboleta absurda ornitorrinca que eu não sei onde foi parar, que eu não sei sequer se parou, enviada pra cá pra me dizer tudo isso assim d’uma vez, me mostrar tudo isso assim sem avisar, sem talvez, sem pena, sem ave, isto é uma louca, louca que eu queria que voltasse, já preparei a luz, a santa, o guarda-roupa, volta.