segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Venha cá!

- Oi, sim.
- Vou lhe contar um segredo.
- O que foi?
- Arh... Ram... Olha: eu não sou eu.
- Como...?
- Shhh!
- An... O quê...?
- Eles não sabem!

É tão foda que

Joaquim:
O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.
O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.
O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.
O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.
Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.
O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.
O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.
O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.
O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.
O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.
O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.
(João Cabral de Melo Neto)


sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Há 100.000 km de vasos sanguíneos no corpo humano. Se todos fossem unidos de ponta a ponta, seria possível dar duas voltas e meia ao redor da Terra.



Quantos mundos cabem em você? 

Passageiro-Caminho

Quando eu entro 
nesse 
ônibus,
degrau,
- eu sei;

(o caminho sou eu.)

que a viagem 
mais longa
é dentro -
de mim.

esse bilhete
o aviso
o letreiro

nem motorista
passageiro
não me enganam:
mais.


(um sonho
me abriu os OlhOs.) 

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Escrever poesia é fácil.

Quero ver peidar!



(Ao grande amigo Danilo
fudido na escatologia
só peida, caga e vomita:
poesia.

Um dia ainda vâmo,
mas vâmo ligeiro
cagar, mijar, declamar,
numa podridão
de desbanheiro:

cada um gritando bêbo
sebo
'múndicie
cada quem de sua latrina.
afinal:
o que pode ser mais poético
lírico
bíblico

melado
viscoso
cheiroso!

do que uma?:
paisagem dos sonhos de cú.

morar numa latrina
refúgio sagrado
cumprir essa sina
todo cagado
Danilo, meu rei,
- quem dera eu
é pra tu.)

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Escondidos

Observavam e riam:
eram invisíveis.

Via como mexia:
como olhava

empunhava seu copo
e afoga a boca nas cores

de modo que
rios delas
lhe mergulharam

a ponto de
, nele,
feliz.