domingo, 29 de janeiro de 2012

Cisne Negro, Astrologia e Psicanálise: O superego e o Id, Saturno e Plutão, Capricórnio e Escorpião: uma especulação. 

Isso não é um texto científico, não é um texto nada, é apenas um texto (se fosse necessário um adjetivo, o que não é o caso, talvez especulativo fosse o mais apropriado). Não possuo conhecimentos profundos sobre psicanálise, de astrologia sei alguma coisa, o filme é muito bom. A questão aqui é juntar os pedaços que compõem o presente, um presente que, é verdade, é meu, ao mesmo tempo em que se intersecciona com um presente maior, do que eu. Assim, parto de mim.

Por uma série de razões, me vi cada vez mais dentro (sim, mais dentro) de uma esfera psicologicizante, de um universo repleto de elementos ligados à mente, mas sobretudo ao inconsciente. É isso, vejo que tenho me movimentado caoticamente em um mundo do inconsciente. Expressões mais ou menos claras disso – expressões que dialeticamente reforçam o impulso, porque se trata de um impulso – são o contato com a obra de Bergman, a leitura de Freud, memórias infantis, mas, enfim, são só expressões: expressões que têm desencadeado impressões, impressões profundas, como uma tensão ou uma inquietação sobre o inconsciente e as relações que ele estabelece com a consciência. É claro, também o Cisne Negro, para além de Bergman, mas apoiado nele, claramente.

Agora vejo, após ter assistido ao filme, que não faltam análises sobre o Cisne Negro em sua relação com as reflexões sobre o superego, o ego, o id. É, de fato, uma associação óbvia, o que não a empobrece. É muito interessante a forma como o conflito superego-id é tratado no filme. O cisne branco, o controle, a disciplina, o trabalho, a interdição; o cisne negro, a pulsão, a entrega, a paixão, instinto. A personagem central está, de fato, no centro desse conflito. Seu superego, hipertrofiado pelas exigências da mãe e do mundo exterior por sucesso, correção, perfeição, governa todo e qualquer ato seu. Ela é inteiramente controlada por essa força, que não lhe permite jamais relaxar; que, enfim, lhe maquinifica. Contudo, sua arte, o balé, pressiona por leveza, entrega, paixão. Sensualidade. Afinal, e aqui há uma completa coerência psicanalítica, a energia psicolibidinal de Nina está como retida, seu superego a enjaula. Seu professor e sua rival (que disputa com Nina o papel principal na peça intitulada “O Lago do Cisne”) representam exatamente essa exigência: os imperativos do id. Nina percebe isso; percebe que, no fundo, só terá o sucesso que seu ideal de ego, seu superego ambiciona, se conseguir, exatamente, libertar-se dele, relaxando e entregando-se. A afirmação do superego, portanto, depende da sua negação. Não é à toa que Nina surta, portanto. Aqui é feita uma boa análise, em que muito que eu precisaria dizer já está dito:

(É estranho o apontamento de que Nina não tem um ego, feito pelo autor do texto. Acredito que seu ego, de fato, esteja brutalmente diferenciado em um superego e, assim, a ele subordinado; e que o processo de formação de sua individualidade é frágil e problemático. Contudo, “a ausência do ego” parece um exagero.)

Esse dois conjuntos confrontados, sua dialética: cisne branco – cisne negro; superego – id; controle – entrega; sexo – castidade ou sexo – amor ideal; repressão – subversão; razão – emoção; instinto – premeditação; esses dois conjuntos em tensão podem ser apresentados de modo diverso, e assim o foram e o são (provavelmente o serão por algum tempo ainda) ao longo da História, mas têm uma mesma raiz. Essa polaridade guarda, em meio a essas diversas manifestações, uma fonte comum. Os termos (repressão-subversão, por exemplo) são expressões diferentes, enfocando diferentes aspectos de uma mesma coisa. O que seria a energia primária? Seria a forma mais abstrata e geral de representar esses dois conjuntos. Talvez razão-emoção? Talvez terra-água, se tomarmos os elementos primitivos considerados pela Astrologia. Entremos na Astrologia, então.

Água é precisamente emoção, sentimento, dissolução; enquanto Terra, razão, controle, limite. É verdade que, quando penetramos nos signos, teremos algumas nuances a observar. Touro é Terra, mas apresenta certa ênfase sobre a sensorialidade, é verdade; no Fogo, há muito de impulso; mas, de modo geral, é possível fazer esse enquadramento e encarar os conjuntos em tensionamento enquanto terra-água.

Contudo, se tomarmos essa premissa e retornarmos aos signos, temos a seguinte questão. A energia de contenção, trabalho, disciplina e racionalidade se aproxima bastante das energias de Virgem e Capricórnio. Contudo, a ambição da personagem reforça uma caracterização capricorniana, mais do que virginiana (em Virgem, a subserviência e a utilidade pesam mais do que o poder e a necessidade de ascensão). Assim, se tentarmos estabelecer a mesma relação em termos de signo, já encontraríamos, por um lado, em terra, a simbologia de Capricórnio – acompanhada de seu planeta regente, Saturno, e da casa X, representantes dessa mesma energia. Esse seria, portanto, o cisne branco.

E pelo outro lado, “água”? Durante o filme, é enfatizada, sob a caractetização do cisne negro, a dimensão da sexualidade, da entrega, da profundidade, dos instintos. Poderia ser estabelecida a relação com Escorpião, de Água, mas também Áries, do elemento Fogo, é verdade. É que as energias de Áries e Escorpião se cruzam, a ponto de Marte, regente de Áries, desempenhar também o papel de regente noturno de Escorpião. Contudo, parece-nos mais apropriada a intersecção com a energia escorpiniana. Com Áries, encontraríamos uma dimensão de comando e de intelecto acentuadas; a entrega também estaria presente, o que não seria diferente com Escorpião. Mas a ênfase sobre a sexualidade, sobre o oculto, e sobre a própria dimensão do inconsciente, da crise, daquilo que pulsa e emerge e arranca: esses são elementos escorpinianos; o cisne negro.

Quando se fala em Astrologia, pode-se pensar desde logo que estamos querendo discutir a partir de uma abordagem metafísica, mas, antes e por enquanto, evitemos essa polêmica. Como dissemos, energias com que os seres humanos têm lidado têm sido tratadas por eles através de muitas formas, de diversos símbolos. Tratemos, então, até aqui, a Astrologia sob esse ponto de vista... Para, no entanto, desconfiar dele a partir do próximo parágrafo. Falo em “desconfiar”, porque este momento, esta pequena morte, no sentido reelaborador escorpiniano, tem colocado muitas convicções em cheque. E a astrologia consistia já, mesmo, numa espécie de convicção. Agora, quem sabe? Um materialismo cru, talvez? Um possível abandono. Não é casual, portanto, tanta especulação. Especulemos, pois.

Saturno, neste momento, encontra-se a pouquíssimos graus do signo de Escorpião. Plutão, regente de Escorpião, encontra-se em Capricórnio. Veja: Saturno, regente de Capricórnio, penetra em Escorpião; Plutão, regente de Escorpião, atua sobre Capricórnio. Não é difícil perceber que há um mutualismo. Cada planeta encontra-se no signo regido pelo outro. As ligações desenham um X. A esse fenômeno, chamamos de dupla regência. A interação entre as energias é, assim, reforçada. Mas o que seria o produto dessa interação?

Precisamente esse tensionamento entre superego e id; entre a pulsão, o desejo; e o limite, a repressão, o controle. Por algum tempo, estaremos, do ponto de vista da Astrologia e da observação dos trânsitos astrológicos, imersos nessas tensões. O produto – genérico – é este conflito. Ele estará expresso em termos sociais, ou seja, em termos de formas de organização social e dos conflitos sociais. O superego como limite; o id como pulsão e desejo social.  A resultante provável disso é um acirramento da luta entre as polaridades direita-esquerda, conservação-mudança, repressão-libertação. O produto, o efeito sobre cada indivído será produzido com maior ou menor intensidade a partir das condições e a partir do mapa astral natal de cada um. Com certeza aqueles que têm ênfase em seu mapa sobre Capricórnio e Escorpião serão atingidos de modo mais direto e profundo. A síntese que cada um produzirá depende de seu ponto de partida (do ponto onde se encontra ao enfrentar esse trânsito, o qual não é um ponto zero, mas um ponto determinado pelo precipitado de respostas produzidas ao longo das experiências anteriores), das experiências que surgirão e das respostas oferecidas. Mas o tema é o mesmo. O enfrentamento entre as exigências sociais e os desejos pessoais; o choque entre o que não é nosso e o que é nosso, operando-se dentro de nós mesmos, é também produto dessa combinação. Isso também oferece importante lugar às críticas e a nossa sensibilidade, a forma como a ela reagimos. A auto-crítica e o modo como a realizamos também terá centralidade.

Quanto ao desafio: Plutão e Saturno, Escorpião e Capricórnio, representam energias pesadas, tensas, de transformação. Saturno representa os limites para que, através dele, o amadurecimento possa surgir; Plutão traz as crises, em que o velho morre para que o novo venha à tona. Isso quer dizer que ambas são energias de trauma, tendem a colocar-nos diante dos pontos cármicos fundamentais. Contudo, não há “maldade” nisso, mas um processo: em que o trauma desorganiza para organizar, o caos tende a um reordenamento. Portanto, um reequilíbrio – um rearranjo – entre desejo e limite, pulsão e controle, superego e id é o ponto para o qual aponta o sentido da tensão. Para alguns, isso poderá significar a necessidade de um maior relaxamento, menos controle; para outros, o inverso. Ou seja, não há resposta universal, apenas um problema universal, que terá de ser resolvido numa interação em que indivíduo e sociedade são inseparáveis.   

Deixando claro, vejo, especulativamente, minha experiência pessoal (que conta com elementos meus, mas também observados por mim, mas que operam fora de mim) intimamente ligada a esse momento mais amplo. Freud, Bergman, memórias, o Cisne Negro e a dupla regência, portanto, são, assim, todos parte de uma coisa só. Como diria Guimarães, eu de quase nada não sei. Mas desconfio de muita coisa. É isso.



sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

É como se fosse; é uma casca. Branca, com traços pretos. Calcário, e o que lhe move é vontade; o que lhe move é dolorosa necessidade de; quebrar; de; destruir; a maldita; casca sagrada.

Seria o caso de lhe perguntar, o que há por trás, depois, dentro, o reverso da casca?; não é; o caso. Não me pergunto. Sou  simplesmente movido pela necessidade, de quebrar, destruir; de fazer nascer, um porco, um anjo, um coração-gema; de fazer que gema; da casca, do ovo, de ti.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Calma:

Que Urano está apenas começando seu trabalho sobre Áries...
Que ainda vem a quadratura, a dupla regência, com muito Plutão-Escorpião, Saturno-Capricórnio...
Que Netuno estará à vontade...
Portanto:
Calma...
Enquanto ela é
mesmo que miseravelmente
possível...

Susto

não é susto.
é instinto.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

(...)

Com a virtualização das relações, ninguém mais fala sozinho: todos falam sozinhos.
Até que a ideia possa ser apalpada.
O objetivo disso é o apalpamento da ideia.
Viver
mais do que isso
e mais do que ser
é ser
composto.

domingo, 15 de janeiro de 2012

Sobre nossa relação com as portas.

Não é à toa que cada porta tem sua fisionomia - mesmo que a maioria delas guarde traços comuns ao de uma velha senhora, se atentarmos ao trinco. A crença (sim, uma crença seca, um pressuposto sem qualquer base racional) de que as portas representam o que há de mais inanimado, ou menos animado, crença essa presente em diversos ditos populares, não é apenas falsa, mas também mentirosa, enganadora e equivocada e má. O que está em curso é um processo - que carrega uma intencionalidade - de desumanização sistemática das portas. Quando uma pessoa reivindica um tratamento justo legitimando a barbárie para com as portas - como se elas fossem feitas de madeira ou algo que o valha - não se trata de outra coisa. Com as portas, vale tudo. E elas sofrem: quando há brigas, seja em casa ou nóutro ambiente, em qualquer tumulto, são arrombadas ou lançadas violentamente contra seu ponto de repouso. Isso quando jamais foi comprovado que uma porta tenha cometido qualquer ato violento (ou de qualquer outra natureza) contra um homem, uma mulher, ou mesmo contra animais de estimação, de rebanho ou silvestres (sejam eles mamíferos, aves, répteis, anfíbios ou peixes). A polêmica com relação ao caso da Porta Satânica demonstra-se, hoje, finalmente, vazia por completo. Nunca foi comprovada sua participação no assassinato das crianças polonesas; contudo, como se sabe, a porta foi sumariamente cerrada e seus pedaços incendiados, sem que lhe fosse concedido qualquer direito à defesa. 

O que parecemos não conseguir enxergar é o encantamento que existe por trás das portas, além de sua utilidade e a forma servil e honesta que assumem diante de nossas necessidades e de nossos desejos. Sempre se argumenta que as portas rebelam-se com frequência (é dessa forma que os homens percebem o enguiçamento, o emperramento, o engolimento de pedaços de chave); não conseguimos nos dar conta de que isso é apenas uma resposta - e sempre é esta a interpretação correta - das portas às nossas faltas para com elas. Temos trabalhado em projetos que buscam substituir as portas por outros instrumentos, outros mecanismos. E todos esses empreendimentos falharam! Será isso à toa? Somos incapazes de realizar a auto-crítica?

Precisamos aprender a nos relacionar com nossas irmãs. Não insultá-las, agredí-las - já conhecemos sua sensibilidade; compreender a forma como cada indivíduo-porta gosta de ser tratado - cada porta tem preferências quanto ao modo de ser aberta, fechada, batida, enfim, tocada de modo geral. São medidas tão pequenas e simples quanto necessárias e urgentes. Mas isso tudo só será possível a partir do momento em que nos abrirmos para reconhecer que são as portas que nos revelam os novos ambientes, que nos permitem transitar, conhecer, aprofundar nossas experiências. Quando nos dermos conta, de uma vez por todas, que sem as portas, estaríamos todos presos... aliás, não. Se não houvesse portas, não haveria nada, estaríamos todos livres, é verdade. Hum, é verdade.
Anotar na agenda, pra não esquecer de resolver na próxima encarnação.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012